terça-feira, 31 de março de 2009

Flowing Data: A Força da Imagem

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The greatest value of a picture is when it forces us to notice what we never expected to see. (John W. Tukey. Exploratory Data Analysis. 1977)

Vivemos na era do conhecimento e da informação, no tempo do “on-line”, das redes de contacto, da partilha e do livre acesso a tudo e a todos. Hoje, mais do que nunca, abdicamos da privacidade dos nossos movimentos para ter acesso a uma panóplia de documentos, dados, informações que nos ajudam a tomar decisões, a fazer opções e a escolher.

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Vivemos num mundo onde os governos e as empresas podem ter acesso a todo o tipo de informação sobre nós. Factos que há uns anos eram desconhecidos, ou pura e simplesmente não existiam, passaram a poder ser conhecidos com relativa facilidade. Por exemplo, é muito fácil construir um mapa dos nossos passos, uma fotografia dos nossos gostos e das nossas preferências. Em que lojas compramos, que tipo de alimentos utilizamos, o que lemos, quais as nossas preferências musicais, desportivas e até sexuais. Até as empresas têm vindo a ser cada vez mais forçadas a revelar informações sobre os seus produtos e os seus serviços, o que vem de certa forma anular o conceito de vantagem competitiva.

A este propósito, descobri recentemente o site "FlowingData", que se dedica a analisar e tratar informação e dados. Aposta na representação gráfica da informação e no tratamento da sua apresentação. Alerta-nos para a importância da forma e do tratamento que é dado à informação e como deste modo a mensagem pode ficar enriquecida.

O "FlowingData" mostra-nos como designers, estatísticos e cientistas da computação utilizam os dados ajudando-nos a compreendermo-nos melhor através da visualização.

A título de exemplo, partilho alguns dos gráficos mais interessantes:

O estado da economia medido a partir da análise de um conjunto de indicadores - "Check In on the State of the Economy". Este gráfico da Russel Investments avalia o estado de sete indicadores relevantes; o risco de crédito, a dívida das empresas ou a volatilidade do mercado, por exemplo. A barra azul permite-nos conhecer o comportamento típico e o marcador laranja mostra-nos os valores actuais. Por cima deste marcador está uma seta que nos indica a direcção actual do indicador.
Como podemos ver a situação é preocupante em termos de dívida, de volatilidade, de desemprego e de crescimento da economia.

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“Obama's $787 billion Dollar Economic Stimulus Plan by CreditLoan” que nos permite visualizar, de forma simples, como foi aplicado o pacote de ajuda económica desta Administração. Ajuda-nos também a perceber como este se diferencia da forma bastante heterodoxa e unidireccional que o nosso governo decidiu seguir, em termos de estimulo da economia.

Temos ainda sobre este tema o “Slicing Up the Economic Stimulus Bill by Associated Press” que detalha de forma exaustiva e transparente, coisa que ainda não se viu em Portugal, para onde foi canalizada a ajuda.

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Para nos dar uma ideia da dimensão, este outro gráfico – “Visualizing Money” está muito bem conseguido e permite uma análise simples em termos da dimensão dos números, do peso dos impostos, da comparação histórica e da proporcionalidade.

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Finalmente, este último sobre a situação a que chegou a General Motors. Concepção gráfica muito interessante e forma simplificada de retratar uma realidade tão complexa.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Açores: Turismo de Qualidade Sustentável

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É sempre com enorme carinho e imensa saudade que recordo os Açores. A distância aproxima-nos, a ausência aguça a memória, o tempo agiganta a recordação.

Volto de quando em vez e sempre menos do que gostaria. Mas é com preocupação que, à distância de uma lembrança, assisto à voracidade do seu desenvolvimento, à avidez da sua transformação, à sede do seu progresso.
Uma luta permanente entre homem e natureza, sempre em detrimento do segundo, uma conquista fácil do betão para benefício do turismo, uma avalanche de transformações para repasto do desenvolvimento.
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Sinto que os Açores estão diferentes; sinto-os menos rurais e mais citadinos, sinto-os menos verdejantes e mais policromáticos, sinto-os menos azuis, sinto-os menos rudes e mais sofisticados, sinto-os menos exuberantes e mais uniformizados, sinto-os menos especiais e com menos personalidade.

E não será a mais valia dos Açores precisamente a sua rudeza? As suas gentes? A sua topografia? As suas aldeias de basalto e os seus lugarejos de ausência? A sua vegetação luxuriante? As pontes estreitas que aproximam desfiladeiros imensos lá para os lados do Nordeste?

Paisagem de cores pensativas e quietas, que nos afastam de um mundo de febre e de vertigem. À primeira curva da estrada, o olhar reencontra campos de pastagens, as vacas dispersas a aguardar mais uma recolha de leite. Muito dificilmente se apaga da memória a diversidade de tons verdes, através dos campos, das matas, dos vales e das encostas. “Perduram vestígios de eras remotas, cicatrizes de convulsões sísmicas, a morfologia vulcânica da ilha. Ainda e sempre o mistério das origens, na evidência dos sinais”. São estas as características que os turistas procuram, são estes os Açores da minha memória.

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Em 2001, escrevi, creio que para o Jornal Açoriano Oriental, um artigo sobre a necessidade de apostar no desenvolvimento sustentável dos Açores. Depois de 8 anos de argamassa, de calcário e de ácido fosfórico, torna-se ainda mais premente travar este desígnio suicida de edifícios gigantescos, marinas vazias, SCUTs desertas, polidesportivos e multiusos que asfixiam a sua beleza, que descaracterizam as suas gentes. Deixo para reflexão o “Turismo de Qualidade Sustentável” que é hoje mais do que nunca uma necessidade, uma obrigação.
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::::::::::::Açores: Por um turismo de qualidade sustentável (I)

A indústria do lazer constitui, actualmente, uma realidade em grande ascensão e desenvolvimento, em todo o mundo. De facto, nos tempos modernos uma das preocupações mais evidentes, das populações mais desenvolvidas, é de como ocupar os tempos livres. Esta preocupação explica o crescimento exponencial verificado com o sector do turismo que em 1999 atingiu o valor histórico das 657 milhões de chegadas.
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Segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT), Portugal ocupa o décimo quinto lugar no ranking dos países receptores de turistas com 11,6 milhões de turistas por ano. Neste cenário, os Açores ocupam um lugar menor mas com níveis de crescimento consideráveis nos últimos anos, e acima de tudo, perspectivas verdadeiramente ambiciosas para os próximos; espera-se uma duplicação da capacidade de oferta em 3 anos. O arquipélago deverá passar por uma verdadeira revolução turística que transformará, radicalmente, o meio tal como o conhecemos actualmente.

Tendo em conta este cenário de mudança devem-se colocar várias questões pertinentes:

Qual a capacidade de suporte da região, em termos de investimento turístico, sem danificar a natureza e os ecossistemas?

Será que se procedeu a um planeamento turístico detalhado que acautelasse as riquezas naturais, sociais e ambientais da região?

Estarão os Açorianos preparados para esta mudança que se avizinha?

Será que o mercado já compreendeu que a dimensão da região não lhe permite concorrer em quantidade mas antes em qualidade?

Será que os Açorianos e, em particular, a burguesia empreendedora têm consciência da necessidade de preservar a riqueza natural e humana dos Açores?

O crescimento e o desenvolvimento constituem, fortuitamente, uma inevitabilidade das economias de mercado e uma consequência natural das democracias modernas, por isso mesmo, a geração de riqueza é essencial para o aumento do nível de vida das populações. Mas o crescimento quando não planeado pode, facilmente, atingir proporções contraproducentes e prejudiciais para o meio e para as gentes.

Não podemos descurar o impacto profundo do turismo no ambiente, a possível descaracterização do meio, o aumento descontrolado da densidade populacional, a rápida escassez dos recursos, o desrespeito pelo ambiente, a utilização das paisagens até níveis próximos da exaustão.

O planeamento cuidado, a preocupação com o ambiente através do dimensionamento adequado da oferta, a diferenciação pela qualidade do produto oferecido, a qualificação pela formação profissional disponibilizada, são aspectos essenciais que não podem ser descurados.

Os Açores devem apostar num desenvolvimento sustentável, ou seja, crescer mas através de uma interacção perfeita e controlada com o meio.

O termo Desenvolvimento Sustentável define um conceito defendido pelas Nações Unidas, mais concretamente pela Comissão para o Ambiente e Desenvolvimento. De acordo com a ONU, “desenvolvimento sustentável significa satisfazer as necessidades da população actual, sem comprometer a capacidade das futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades”.

Esta definição reflecte o problema que a insustentabilidade do desenvolvimento mundial acarreta. Com o constante crescimento da população tem-se assistido ao aumento da procura de recursos, como a água, a energia e o solo. Por outro lado, a globalização da economia tem aumentado os hábitos de consumo, potenciando a produção de resíduos e multiplicando a mobilidade da população. A sobre-exploração dos recursos naturais, tem sido tão elevada que estes começam a entrar em ruptura.

Perante este quadro muito pouco abonatório, a solução preconizada por muitos países e regiões, aponta para um desenvolvimento sustentável.

São actualmente aceites 7 princípios que, se correctamente aplicados, garantem a sustentabilidade do desenvolvimento:
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Eficiência energética: Consiste na utilização de equipamentos, que tenham os mais baixos consumos energéticos, para o mesmo custo económico e ambiental, ao longo da sua vida útil. Este princípio deve ser aplicado a todo o tipo de equipamento, seja ele industrial, comercial ou pessoal.
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Energias renováveis: A utilização de energias renováveis visa, essencialmente, reduzir a pressão sobre recursos escassos. Outro factor relevante incide no grau poluente das energias renováveis que é muito inferior ao das energias convencionais.
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Edificação ecológica e bioclimática: A edificação ecológica consiste em utilizar, na construção de edifícios, os materiais que impliquem um menor consumo de energia e emissão de poluentes. A edificação bioclimática, obriga a que os edifícios fiquem orientados de forma óptima, de modo a minimizar os impactos da temperatura exterior, reduzindo assim a utilização de climatizadores.
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Eficiência na mobilidade: Este ponto pressupõe a existência de estudos destino-origem, por forma a definir trajectos óptimos e soluções (ex: transportes públicos) que minimizem o volume de deslocações e o seu impacto ambiental.
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Tratamento e reutilização de águas: Consiste na problemática da escassez de água potável, ou seja, a racionalização do consumo e a reutilização da água.
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Tratamento e reciclagem de resíduos: Este penúltimo ponto baseia-se na teoria dos “3R”, reduzir, reutilizar, reciclar.
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Participação da população: É o ponto chave de todo um desenvolvimento sustentável. Aqui reconhece-se a importância da população para um futuro sustentável, pois terá que partir da própria população a aplicação de todos os princípios atrás mencionados. Se assim não for, as políticas de incentivo para aplicação de todas as recomendações não terão qualquer efeito. Se a população se sentir parte integrante deste processo, sentindo que a sua opinião é válida, todas as políticas terão o seu resultado potenciado e reconhecido num prazo significativamente mais curto.

A aplicação destes princípios garante a complementaridade entre o desenvolvimento económico, o desenvolvimento social e a protecção ambiental.
Actualmente existem vários exemplos deste tipo de desenvolvimento que devem ser analisados atentamente; é o caso de Lanzarote, nas Canárias, e o de Calviá em Maiorca.
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Um projecto desta natureza e com um espectro de actuação tão amplo e ambicioso obriga, necessariamente, a um forte empenhamento e esforço de mudança por parte das entidades responsáveis pela estratégia de crescimento perspectivada.Considero critico reflectir sobre o projecto de desenvolvimento que se espera para os Açores, e sobre qual a melhor forma de o conseguir. Não nos iludamos com as facilidades do progresso nem sobrestimemos as capacidades altruístas de quem tem o poder de decisão. Cabe-nos a nós fomentar a discussão e contribuir para a preservação do nosso, precioso, património.

quarta-feira, 11 de março de 2009

"The Washington Experience"

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(Deixo o testemunho que publiquei na Newsletter da Comissão Fulbright)
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I have spent the last three months of 2008 in the United States through a Fulbright Scholarship that allowed me to be in a professional and academic environment.

Last August I went to Washington DC to start an internship program with the United States Postal Service (USPS). This program has been one of the most fulfilling and rewarding experiences of my life and I welcome the opportunity to thank the Fulbright Commission for allowing me to have this possibility. This was a short stay with an enormous meaning, a small exchange with a huge output, a little time with a long lasting memory.

(Centro de Tratamento de Correio cujo nome homenageia a memória daqueles que falaceram aquando do ataque de antrax)

I was eager to learn from the best, to work with the most qualified in this field and it was with great pride and vast expectations that I embraced the program with the United States Postal Service. Today I can assure that I left with a feeling of fulfilment, accomplishment, completion and great success. And so it is that I carry with me from this experience the enduring knowledge, the lasting vision, the solid understanding of the biggest postal company in the world.

In September I enrolled in an academic program with the George Washington University and the Center for Excellence in Public Leadership. I finished the Senior Executive Development Program which prepares candidates for the Senior Executive Service (SES). The program is designed for senior managers in the federal government, GS-13 through SES level and comparable level military, state, and local officials who wish to enhance their abilities today in order to meet tomorrow’s leadership challenges.

This was a fulfilling happening and I certainly feel richer today. I learned immensely about the public service in the US, met very interesting people, contacted with well known teachers and gained knowledge of new and different management and leadership techniques that I can certainly apply in my country.

Washington DC was also a marvellous experience, a beautiful city that will always be in my heart. The Potomac and the Virginia shore, the grass on the banks, the colours of autumn, the sun rise over the Jefferson Memorial, the morning traffic as people make their way to work, now and then a sailboat on the river. As Marjorie Williams once wrote about this city “the truth is that many newcomers stay forever, secretly at home in the city everyone loves to hate” I believe that Washington always does more to change its newcomers than newcomers do to change it. It certainly changed me.

Like John Winthrop when he came to the United States, as an early Pilgrim, I imagined it like the “shining city upon a hill”. I have always looked up to the United States; it was my mother’s birth place, my childhood memory, my dream society, the reference of my aspirations, the model to my work. For what Pericles said to the Athenians has long been true of this country: "We do not imitate—for we are a model to others."
I returned with high hopes, in good spirit, with deep humility, and with very much gratefulness in my heart.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Por um País mais Produtivo

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Tenho andado a desencantar artigos que escrevi no passado e que de uma forma ou de outra têm alguma actualidade; seja porque a situação se mantém inalterada ou mesmo se agravou, seja porque o tema continua a ter interesse e agora é um bom momento para o repescar partilhando-o no ciberespaço.

A temática relativa à produtividade continua actual e critica para a nossa economia. Considero aliás que se trata de um dos nossos principais problemas e de um entrave ao nosso crescimento. Em 30 de Julho de 2002 escrevi no Diário Económico um artigo que se intitulava “Por um País mais Produtivo”. É chocante, passados que estão praticamente sete anos, ver que a situação do país se agravou e que o nosso afastamento em relação à média da EU piorou.

Em vez de alcançar o patamar dos outros países da união, Portugal está ficando para trás, e o seu produto interno bruto per capita caiu de 80% para 70% da média da UE desde que a Agenda de Lisboa foi lançada. A produtividade do trabalho, cerca de 40% da média da zona do euro não apresenta quase nenhum aumento desde o ano 2000.

O baixo nível educacional e o efeito prejudicial que isto tem sobre a produtividade, as universidades, a pesquisa e as inovações estão entre as principais causas da baixa competitividade e do reduzido crescimento de Portugal, de acordo com organizações internacionais. A Organisation for Economic Cooperation and Development (OECD) afirmou que o desempenho dos estudantes secundários portugueses estava entre os mais fracos do mundo desenvolvido e que o índice português de evasão escolar é um dos mais elevados. Segundo esta organização, a redução da "lacuna de capital humano" que separa o país dos outros países desenvolvidos é "essencial para que Portugal melhore a sua produtividade e volte a procurar chegar ao nível dessas outras nações".

A situação actual não é favorável e a recessão que se vive tem obrigado os países a agravar de forma significativa as suas despesas fazendo disparar os seus deficits orçamentais. Infelizmente a situação agrava-se quando os países já tinham uma despesa pública muito elevada como era o caso de Portugal.


Os dados relativos ao OE para 2009 são elucidativos e desta forma, o aumento da despesa pública e o abrandamento da economia levam a despesa do Estado a representar 50% do PIB, pela primeira vez na história.

Deixo o meu artigo, com sete anos, uma vez que a situação se mantém, as preocupações são as mesmas, o diagnóstico idêntico e a necessidade de mudança continua uma evidência.

:::::::::::::::::::::::::::::Por um País mais Produtivo

Um dos argumentos mais fortes para justificar o atraso económico do País é a baixa produtividade da economia portuguesa que, num mercado aberto e concorrencial, nos cria problemas imensos de competitividade externa. Desde o início da economia moderna Portugal sofre desta deficiência congénita e por mais capital que receba de fontes externas, fundos europeus e remessas internacionais, mais longe se encontra dos padrões médios da produtividade europeia.

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O produto por trabalhador corresponde, em Portugal, a 43% da média da UE, enquanto que em 1986 era equivalente a 41%. Passados 15 anos a evolução foi desprezível, o que vem reforçar a nossa clara incapacidade de convergir, em termos de rendimento, para a média da U.E. A título exemplificativo, um Luxemburguês produz num dia de seis horas o que um Português produz numa semana inteira (três vezes de diferença de produtividade), logo um nível de vida na cauda da Europa.

Por outro lado, o custo do trabalho por unidade produzida tem aumentado a taxas superiores à média europeia, o que teve um impacto, profundamente, negativo na competitividade das empresas portuguesas, as quais foram afectadas por uma taxa de inflação mais alta que a Europeia. Esta baixa de competitividade é uma das explicações para a perda de quota de mercado das exportações portuguesas nos últimos anos.
A situação não é fácil e a evolução registada até aqui em termos de estratégia de investimento, de sistema educativo, de melhorias de eficiência, de crescimento incontrolável de despesa pública corrente, indiciam uma situação preocupante num futuro próximo.

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É fundamental ganhar quotas nos mercados de exportação orientando a economia portuguesa decisivamente para o exterior. O peso das exportações em relação ao produto tem de aumentar sustentadamente nos próximos anos. Este é o grande desafio para a economia portuguesa, devendo constituir a primeira das prioridades da política económica. Só assim será possível aumentar a taxa de crescimento da economia e garantir uma convergência estrutural e sustentada com a média do rendimento europeu.
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O que determina a capacidade competitiva de um país, segundo Michael Porter, "não é o que o país produz, mas quão sofisticado e produtivo é esse país a fazer o que faz", pelo que a chave do problema já não se encontra nas condições macroeconómicas, impostas pela adesão ao euro, mas na "sofisticação microeconómica", traduzido no ambiente da qualidade dos negócios, onde entram as infra-estruturas e a legislação, entre outros factores.
O crescimento da Produtividade e da Competitividade será o grande e imediato desafio que não pode ser mais adiado sob pena de estagnar o crescimento do bem estar dos portugueses, afastando-nos assim da convergência real com a União Europeia.
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No contexto do alargamento da União Europeia ao Leste, onde a mão-de-obra é mais barata e melhor qualificada, e com a produtividade portuguesa nos níveis actuais, uma maior flexibilização da legislação laboral é essencial para, conjuntamente com a desburocratização do país e a diminuição dos encargos fiscais sobre as empresas, assegurar a competitividade externa portuguesa, evitando assim que algumas empresas possam trocar Portugal por destinos geograficamente menos periféricos.
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Em Portugal o peso do Estado corresponde a 47% da despesa nacional enquanto que na Irlanda este rácio é de apenas 32% e na Espanha é de 40%. Actualmente o Estado constituí o principal empregador com cerca de 700 mil funcionários, ou seja, 15% da população activa. Num cenário como este, a responsabilidade do Estado pela evolução do indicador de produtividade vem, claramente acrescida.
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Mas o Estado é o maior obstáculo ao desenvolvimento da produtividade; condiciona, entre outros determinantes, os recursos humanos por via do ensino, da formação e a investigação e desenvolvimento por via do seu quase exclusivo financiamento público. Detém ainda a propriedade e a gestão da maior parte das infra-estruturas de transportes, condiciona negativamente as relações laborais e enviesa a concorrência com subsídios e desadequados regulamentos, frequentemente não cumpridos. É ineficiente na prontidão da Justiça e mantém uma obsoleta administração pública. O Estado é ainda o maior empregador, o maior prestador de serviços, o maior comprador e o maior grupo empresarial. É juiz em causa própria e regulamenta (ou não regulamenta) muitas vezes em função de interesses eleitorais.
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Apesar de tudo, as empresas e os cidadãos têm também importantes responsabilidades e funcionam, muitas vezes como obstáculo à mudança. São insuficientes os objectivos de qualificação das empresas, o fraco envolvimento destas nos mercados externos, a fraca ligação inter e intra indústrias e o baixo investimento privado em I & D, a fraca qualidade da gestão das empresas e a baixa qualidade da força de trabalho
Por isso mesmo, ao Governo exige-se muito e rapidamente mas o papel dos cidadãos, das empresas e da sociedade em geral não pode ser descurado.

A situação que se vive no mercado de trabalho não é conjuntural é estrutural e a função pública não pode nem deve ser excepção. Por isso mesmo em vez de adoptarem uma atitude de reivindicação primária por privilégios e regalias irrealistas como estão a fazer os sindicatos da função pública, é melhor que as gerações mais novas se preparem para a realidade que as espera. Entrar no Estado vai deixar de ser garantia de um emprego seguro e para toda a vida. Os planos de carreira, com promoções por antiguidade que conduziam os indivíduos da base ao topo da hierarquia e estão na base daquilo que se convencionou chamar espírito do funcionalismo público acabaram.

As alterações propostas pelo Governo são justificadas com critérios de racionalidade, eficiência económica e qualidade do serviço prestado. São necessários esforços consideráveis de todas as partes e a alteração da legislação laboral é disso um exemplo, sem sacrifícios não há mudanças e sem mudanças não há progresso e desenvolvimento.

É necessário criar em Portugal um sentimento de mudança e de progresso cada vez mais alargado, e a única forma da economia ser competitiva é aumentar de forma sustentada a produtividade. Mas para além disto, aquilo que na realidade Portugal precisa é de um verdadeiro choque cultural, ou seja, mudar a nossa atitude face ao trabalho e face aos outros.Sem choque cultural de pragmatismo, simplicidade, pensamento positivo e vontade de andar para a frente, nada disto mudará. “Sem choque cultural não haverá convergência com a Europa e será sempre verdade o que dizem os brasileiros: Primeiro vai-se a Portugal, depois viaja-se para a Europa”.

quarta-feira, 4 de março de 2009

O Tsunami Americano

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Em 24 de Julho de 2002 escrevi um artigo no Diário Económico que hoje voltei a consultar e que resolvi partilhar. Naquela altura os sinais de uma crise económica e a própria situação em muitas economias eram preocupantes e apontavam para uma depressão sem precedentes. Tal facto não se veio a verificar no imediato e as economias, em particular a Americana, mantiveram-se anémicas mas em funcionamento.

A guerra do Iraque, a desvalorização do dólar, o crescimento exponencial da China e a consequente compra de divida americana, a continuada descida das taxas de juro e o incentivo ao crédito contribuíram para atenuar/adiar a crise que parecia iminente e que veio a explodir, em todo o seu esplendor, no ano de 2008, seis anos após o artigo que aqui vos deixo:

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::::::::::::::::::::::::::::::::O Tsunami Americano

Estamos hoje perante a primeira crise económica do século XXI, mais uma das consequências do 11 de Setembro de 2001 data mítica que ainda povoa o imaginário colectivo do mundo desenvolvido. É certo que a crise económica tinha sido desencadeada muito antes disto mas é indiscutível que este acontecimento veio despoletar um sentimento de pavor, de desconfiança e de fuga sem precedentes que acelerou, consideravelmente, o processo de deterioração económica.


As economias desenvolvidas viveram nos últimos anos um período de assinalável prosperidade e crescimento, as doutrinas de mercado e as ideologias liberais que fizeram escola nos Estados Unidos foram disseminadas de forma crescente por todas as economias de mercado. A criação de valor para o accionista, o adopção de critérios contabilístico - financeiros inovadores, a euforia das fusões e aquisições, a desregulamentação da maioria das industrias, a febre da internet, a fúria consumista das stock-options, o expoente máximo do mercado – o Nasdaq.
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Mas na realidade durante a 2ª metade da década de 90 o mundo viveu iludido por um sentimento de facilitismo, por uma prosperidade fictícia, por um crescimento sem sustentação. Criou-se para a economia Americana o mito do gigante com pés de barro, sustentado por uma teia de cumplicidades, mentiras e estatísticas maquilhadas, enquanto que na Europa os governos socialistas apanhavam a onda e dedicavam-se ao que melhor sabem fazer – esbanjar dinheiro. Portugal, França, Alemanha, Itália, viveram acima das suas capacidades e gastaram demais quando o recomendável seria contenção, reformas e liderança forte. Neste momento os castelos de areia e os oásis de prosperidade desapareceram e a realidade que se nos depara é de uma crueza demolidora.
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Espreita no horizonte, qual algoz furibundo, uma crise sem precedentes só talvez equiparável ao holocausto económico de 1929. Trata-se de uma crise que vem abalar os alicerces do liberalismo moderno, que emana do tecido empresarial e que é acompanhada por um sentimento de pavor social generalizado.
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Poderemos estar perante um importante retrocesso do modelo de economia de mercado assente no “laissez-faire” do capitalismo. Uma situação deste tipo poderá ter consequências decisivas sobre a forma como as economias encaram o investimento, sobre o papel dos governos e o seu grau de intervenção nas economias, sobre a maneira de fazer negócios dentro e fora de fronteiras, talvez estejamos a caminhar para uma economia mundial sem ímpeto, sem dinamismo e fechada sobre si própria.
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Os críticos indefectíveis do modelo corporativo americano rejubilam com a perspectiva de pela primeira vez terem a razão do seu lado. A descredibilização do sistema financeiro, o desmoronamento dos mercados, a crescente crise de liquidez, os níveis mínimos das taxas de juro e agora a tendência confirmada de desvalorização do dólar, vêm por em causa o modelo de desenvolvimento Americano.
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A queda do comunismo e o “boom” americano dos anos 90 foram decisivos para a criação da ideia de que o modelo de negócio americano constituía o padrão a aplicar a qualquer país. As crises financeiras na Ásia, América Latina e Rússia, a falência do estado providência Europeu, o desmoronamento do Japão, foram factores decisivos para a credibilização Americana consolidada pela influência, o rigor e a exigência de organizações como o FMI, o Banco Mundial e a própria Reserva Federal.
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Neste momento existe uma forte possibilidade de os Estados Unidos entrarem numa recessão da qual ainda não se haviam libertado totalmente. A desvalorização continuada do dólar, este ano já se desvalorizou cerca de 10%, pode significar uma grande mudança. O perigo da desvalorização pode amedrontar os consumidores Americanos, os motores da economia mundial dos últimos anos. Segundo George Soros “as tendências nos mercados cambiais tendem a manter-se vários anos e aparecem acompanhadas de grandes mudanças”. Neste momento os maiores aforradores mundiais observam com reticências a inacção da Administração Americana e começam a retirar os seus fundos dos E.U..
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A economia norte-americana não tem já grandes instrumentos para vencer uma destruição acentuada de liquidez. As taxas de juro de referência da Reserva Federal estão nos seus níveis mínimos e a última arma de choque expansionista está já em acção, a desvalorização do dólar. “O pesadelo dos pesadelos é ver os Estados Unidos apanhado na armadilha em que está o Japão há mais de uma década. Foi uma crise bolsista no início dos anos 90, contagiada aos bancos, que deixou o Japão numa deflação quase crónica.”
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Enquanto isso a Europa vive sobressaltada pelo fantasma do Pacto de Estabilidade, qual camisa de forças que neutraliza todo e qualquer esforço de revitalização económica. O equilíbrio orçamental, a transparência das contas, o cumprimento de critérios contabilísticos claros devem constituir práticas inerentes ao funcionamento de qualquer estado/governo em qualquer economia. Mas será um erro centrar os esforços de uma governação no equilíbrio das contas públicas enquanto a economia definha a olhos vistos, as empresas despedem e reduzem custos até ao limite do aceitável para a sua sobrevivência e as pessoas contam os tostões.
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A economia Americana vai, certamente, deixar de ser o motor da economia mundial, como acontecia até aqui, mas acredito que existe, apesar de tudo, uma janela de oportunidade para o aparecimento de um modelo de negócio Europeu, um misto de “capitalismo selvagem” e “estado empresário” onde a tónica deverá ser sempre, a de um estado mais regulador, mais informado, mais eficiente e mais credível.
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Estou certo de que o agravamento da situação económica mundial, com o prenúncio de uma nova recessão nos Estados Unidos, obrigará a União Europeia a rever, rapidamente, os critérios subjacentes ao Pacto de Estabilidade, tentando assim minimizar os efeitos do “Tsunami” Americano.