quarta-feira, 16 de junho de 2010

“Sayonara Takashimaya”

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Foi com pena que descobri o fecho dos armazéns Takashimaya, em Nova Iorque. Quando me preparava para visitá-los mais uma vez, deparei-me com as portas fechadas e uma mensagem de nostalgia, idêntica aliás à que figura no site da empresa e que deixo aqui:
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Situados em pleno coração da 5ª Avenida, num edifício imponente e distintivo, os armazéns Takashimaya constituíam uma referência para a elite Nova Iorquina e um local de passagem obrigatório para os turistas mais sofisticados.

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Entrar neste espaço constituía uma experiência única de bom gosto, sobriedade, beleza e paz. Efectivamente era notória a diferença ao entrar. A calma e a serenidade imperavam por oposição à agitação e ao movimento da 5ª Avenida e à confusão reinante nas lojas circundantes.

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Fundado em 1829, em Kyoto, por Iida Shinkichi, o grupo Takashimaya começou por funcionar como armazém de retalho para roupas e para atoalhados de algodão. Ao longo dos anos cresceu e tornou-se mais sofisticado e exclusivo. Actualmente possui lojas em Singapura, Taipe, Paris, estava em Nova Iorque e está em vários locais no Japão.



Ao que tudo indica, todo este requinte tinha um custo excessivo e a loja apresentou, nos últimos anos, resultados negativos, por isso a decisão de encerrar. A Takashimaya Co. pretende igualmente continuar a investir no Oriente, tendo como objectivo a abertura, já em 2012, de uma loja em Xangai com 40.000 metros quadrados. O espaço de Nova Iorque, que abriu em 1993, tinha já 1.700 metros quadrados e ocupava vários andares. Entretanto o valiosíssimo 693 de Fifth Avenue foi vendido ao fundo Thor Equities e em breve será ocupado por outro espaço comercial.
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Sayonara Takashimaya from Sample Sally on Vimeo.

Para sempre ficará a recordação do “Tea Box Café”, espaço de reflexão e de frescura, repleto de aromas e de chás distintos, especiarias e um sem número de acessórios que alimentam o ritual oriental do chá. Ficará também a imagem do espaço florido, repleto de artigos únicos e exclusivos, uma atmosfera de odores, uma dimensão quase mágica, um requinte de excelência na qualidade dos produtos e na própria forma de os embrulhar.

Fará certamente falta a muitos New Yorkers, mas o peso da sua marca continuará presente na fachada do 693 de Fifth Avenue.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Maré Negra para Obama

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No momento em que escrevo, o Presidente Obama prepara-se para fazer uma declaração ao país relativa ao tema da maré negra que assola o Golfo do México há 54 dias ininterruptos.
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Esta que é certamente a maior catástrofe ambiental de todos os tempos, e não apenas a maior catástrofe dos Estados Unidos, constitui o tema do momento na opinião publicada americana, quer se tratem de jornais quer de televisões. Ainda ontem, Anderson Cooper da CNN, que se encontra no local há vários dias, fazia um relato assustador da situação. A BP, até agora, tem revelado uma dificuldade notória e uma inabilidade flagrante a lidar com a situação. Reconheço que não tenho conhecimentos técnicos que me permitam analisar o grau de competência das medidas que têm sido tomadas. Tenho sim uma percepção clara do enorme sentimento de impotência que parece abalar a equipa que comanda esta operação.
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Até há cerca de dois dias, a postura da Administração Americana parece ter sido de alguma passividade. Apesar das ameaças claras, a BP tem conduzido as operações de forma autónoma, tendo inclusive rejeitado ajudas de outras empresas habilitadas. A pressão tem vindo a aumentar proporcionalmente à incapacidade de resolver o problema. Os americanos vivem angustiados com a situação e começam a exigir medidas mais exigentes e uma postura mais determinada do Presidente. Neste sentido, há dois dias atrás, a Administração fez um ultimato à BP; tinham 48 horas para resolver o problema. O prazo termina hoje e daí certamente a comunicação de Obama ao país. Não faço ideia das surpresas que pode trazer esta comunicação, mas, à semelhança de muitos americanos, começo a ter uma opinião cada vez mais crítica em relação a Obama e, neste particular, à forma como tem vindo a gerir a situação. Este ultimato parece-me até relativamente caricato, uma vez é mais ou menos óbvio que a situação não se resolverá em 48 horas.
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Este Presidente tem vindo a decrescer significativamente nas sondagens e aquela aura que o envolvia começa a desvanecer. Neste momento, Obama é mais apreciado fora da América do que cá dentro e o seu modelo de liderança tem contribuído bastante para que tal aconteça. Obama começa a ser comparado ao Presidente Carter; um homem inteligente e com ideias válidas, mas com alguma incapacidade para liderar e operacionalizar.


A América, desde a última vez que cá estive, há cerca de um ano atrás, parece em franca recuperação. Os sinais de crise ainda persistem mas nada comparáveis com os de há um ano atrás. A título de exemplo, que tem um valor relativo, estive este ano a jantar no mesmo restaurante que há um ano atrás e sensivelmente no mesmo dia. No ano passado eu era o único cliente; neste ano o restaurante estava a abarrotar. Os sinais de dinamismo são claros e evidentes, mas a dívida dos Estados, aqui também, aumentou de forma significativa e as políticas desta Administração parecem conduzir para um aumento ainda maior, o que tem levantado vozes autorizadas em protesto para com o aumento do peso da dívida. A situação no estado de Nova Iorque constitui um bom exemplo. O peso do deficit do estado e os encargos com a dívida são tão elevados, que estes dias está em discussão o possível encerramento do governo estadual.
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Obama tem neste momento um reduzido campo de manobra. A sua actuação no caso BP; na resolução do caos ambiental e no processo indemnizatório que se seguirá, podem ser decisivas para marcar o seu mandato e clarificar a sua postura.

domingo, 13 de junho de 2010

"Puerto Rican Day Parade"

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No segundo Domingo de Junho celebra-se em Nova Iorque o dia da comunidade de Porto Rico. A avenida mais emblemática do mundo abre-se para receber uma parada de carros alegóricos com dançarinas e músicos em grande festejo. A comunidade hispânica; as bandeiras, os gravadores gigantes, as geleiras com comida, os chapéus à banda invadem os passeios das griffes da moda e assiste-se, ao vivo, à comunhão terrena entre a elegância e a rudeza, entre a opulência e a simplicidade, entre o requinte e o banal.
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Durante um dia inteiro, aqueles que são os verdadeiros motores desta economia, aquela classe indiferenciada de trabalhadores inqualificados que movimenta esta cidade e grande parte deste país, sente-se recompensada pelo seu esforço e sonha com um futuro promissor, nesta terra de oportunidades.
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Ontem ao fazer a ligação de ferry para Statem Island, passei ao lado de Ellis Island, a mítica porta de entrada para milhões de imigrantes que ao longo dos anos chegaram a estas paragens. “De 1892 a 1954, essa ilha era o primeiro lugar que os imigrantes, provenientes do continente europeu pisavam após uma longa viagem em navios a vapor. Quase 12 milhões de pessoas chegaram a essa ilha em busca de uma oportunidade no novo mundo”. Em 1990, o edifício principal que servia como posto de exame dos imigrantes que chegavam da Europa foi transformado em museu e hoje é possível visitá-lo e apreciar alguns dos documentos, filmes, fotografias, que fazem parte desta história.
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Ellis Island, a par da estátua de liberdade, constitui um símbolo de uma terra de oportunidades, verdadeiro ícone para o mundo livre, uma nova vida para muitas famílias que aqui chegaram.:
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Staten Island é um dos cinco distritos de Nova Iorque e fica sensivelmente a meio, entre Brookllyn e Jersey City. Com um número reduzido de habitantes é um pouco o distrito esquecido e “marginalizado” pelos grandes. É por vezes chamado de o “distrito esquecido, uma vez que é o mais distante de Manhattan, e o único não ligado directamente a esta. O ferry boat que liga as duas ilhas é um dos meios de transporte mais utilizados pelos nova-iorquinos que vivem em Staten Island e trabalham em Manhattan. “Calcula-se que por dia 60 mil pessoas passam perto da Estátua da Liberdade”.
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É interessante observar esta metrópole à distância, contemplá-la na sua dimensão, apreciar-lhe as formas, as sombras, o modo como se expande e a dinâmica que transmite. Mas se olharmos com mais atenção percebemos também como é implacável e inacessível, como pode ser disciplinadora e inflexível para os que pretendam esconder-se atrás do facilitismo, do amiguismo, do compadrio, da malandrice. Aqui trabalha-se muito, de sol a sol, nem aos fins-de-semana se para e, mesmo assim, é vê-los hoje eufóricos e satisfeitos a descer a 5ª Avenida, com a bandeira dos Estados Unidos, lado a lado, com as bandeiras dos seus países de origem.
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sábado, 12 de junho de 2010

“A Doodle 4 Google”

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Depois de uma chegada chuvosa, o Sol voltou a Manhattan. O dia de Portugal foi passado nas ruas de Nova Iorque; alheado das comemorações oficiais e da expectativa rotineira dos discursos inconsequentes, esquecido das condecorações e das reacções de eventuais destinatários de discursos. Sabe bem estar longe do ciclo de sempre, da rotina de sempre, das caras de sempre.
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O Central Park pelas 8hoo da manhã está maravilhoso; repousa majestático no coração de Manhattan, imponente no seu verde radioso, misterioso nos jogos de luz por entre ramos mais altos. A esta hora da manhã os principais frequentadores são os Passeadores de Cães, aquela invejável profissão, que acredito tenha nascido nesta cidade. Depois temos os desportistas madrugadores que antes do trabalho fazem o seu jogging matinal e os jardineiros e varredores que mantêm este parque impecavelmente limpo. A partir das 8h30 começam a aparecer também as Passeadoras de Crianças; sobretudo latinas e orientais que trabalham nos prédios circundantes e que vêm aproveitar o primeiro Sol da manhã.
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Ouvi falar português do Brasil, facto que se tem vindo a tornar cada vez mais frequente nesta cidade. Os brasileiros são, actualmente, os verdadeiros impulsionadores da língua portuguesa no mundo, estou convencido que sem eles a nossa língua não teria nem metade da projecção que tem actualmente, mesmo assim muito aquém do espanhol, que é dominante. Tratavam-se de dois brasileiros que abraçaram a profissão de Passeadores de Cães. Falámos um pouco e fiquei a saber que trabalham desde as 7h00 da manhã até às 7h00 da noite sempre a passear cães, em Central Park. Vão buscá-los aos prédios de luxo das redondezas e em grupos passeiam-nos durante duas horas. Segundo eles, e este é um facto que se pode aplicar também a muitos portugueses – “cachorro aqui vive melhor que brasileiro no Brasil”. Os brasileiros são afáveis por natureza, simpáticos e divertidos. Despedimo-nos com o desejo deles de “boa Copa”.
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Caminhei ao longo da 5ª Avenida até à rua 91, onde se encontra o National Design Museum. Pertença da Cooper-Hewitt Foundation, este museu que está desde 1967 integrado na Smithsonian, ocupa uma mansão de referência na 5ª Avenida – a Andrew Carnegie Mansion. Mandado construir em 1867, este museu constitui actualmente uma referência na área do design histórico e contemporâneo. Desde artefactos utilizados por tribos africanas até aos mais sofisticados sistemas urbanísticos do mundo. “The Museum presents compelling perspectives on the impact of design on daily life through active educational and curatorial programming. It is the mission of Cooper-Hewitt’s staff and Board of Trustees to advance the public understanding of design across the twenty-four centuries of human creativity represented by the Museum’s collection”.
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Curiosamente, foi na exposição temporária que demorei mais tempo. Fiquei a conhecer os trabalhos desenvolvidos por crianças e jovens dos 6 aos 18 anos, oriundas de escolas de todos os estados da América, realizados no âmbito de um concurso promovido pela Google em colaboração com o National Design Museum. Sob o tema “If I could do anything I would…” estas crianças foram desafiadas a desenhar o símbolo da Google, o chamado Doodle. A Google começou a trabalhar/decorar o seu logo em 1999 e hoje tem uma equipa de designers dedicada em exclusivo a esta tarefa. Regularmente, em datas de referência ou períodos especiais o Doodle apresenta um grafismo diferente e original. Pois o desafio era precisamente, tendo presente o lema anterior, criar um grafismo para o Doodle. Os quarenta desenhos que estão expostos são aqueles que foram seleccionados de entre um total de 33.000 mil desenhos. São simplesmente excepcionais, fiquei surpreendidíssimo com a qualidade, a originalidade, a imaginação e a perfeição dos desenhos.
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O vencedor foi um miúdo de 8 ou 10 anos que recebeu uma bolsa de 15.000$ dólares e a sua escola um prémio de 25.000$ dólares, além de ter visto o seu Doodle apresentado no página da Google no dia do prémio.
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quinta-feira, 10 de junho de 2010

“Walking In The Rain”

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Chove copiosamente, o trânsito está caótico, às três da tarde quase não se consegue circular na 7ª Avenida. Nova Yorque está como sempre igual, na sua metamorfose constante. As buzinas dos táxis trespassam os tímpanos dos turistas, um mar de chapéus-de-chuva ornamenta Times Square e os autocarros descapotáveis continuam na sua azáfama diária, agora repletos de turistas encapuçados. Nada pára Manhattan, o frenesim está-lhe nos genes, a miscigenação circula-lhe nas veias, o dinamismo é um traço do seu carácter.
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Chegar a esta cidade ajuda-me a renascer, andar nestas ruas limpa o meu espírito, cruzar-me com estas raças rejuvenesce-me. Não conheço nada que se lhe compare e acabo sempre a repetir-me nos elogios a esta metrópole. Ano após ano, mês após mês, crise após crise, Nova Yorque parece cada vez mais imune e imperturbável na sua personalidade.

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Ainda agora cheguei; cansado, maçado, mal dormido, mas nada me impede de mergulhar nesta multidão, nada me segura no quarto do hotel. Procuro conforto para o estômago e dirijo-me para a rua 57, tenho o “Le Pain Quotidien” em mente mas acabo no Café Europa, curiosamente. De europeu tem pouco; a simpatia, a hospitalidade e a gastronomia são claramente americanas. Sento-me de frente para a rua. Tenho a 7ª Avenida em toda a sua extensão, no meu campo de visão, vislumbro ao fundo os néones de Times Square. Deixo-me estar, agora que me sinto mais confortável. Observo atentamente o mundo lá fora. Esta gente circula a grande velocidade, sinto que se envelhece mais depressa nesta cidade, que o tempo não tem tempo, que vida não pára um só segundo. Um casal de jovens acabados de sair do altar dirige-se em passo rápido para o primeiro táxi que se digna a parar. Dezenas de chapéus-de-chuva aguardam em fila ordeira para entrar no Carnegie Hall, a qualquer hora se almoça ou se janta, em qualquer esquina nos cruzamos com executivos em trânsito ou com um qualquer sem abrigo que dorme ao relento. Nova Yorque é isso mesmo, esta capacidade infindável de nos embasbacar, de nos estarrecer.
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Por esta janela contemplo a alma desta cidade, através deste vidro molhado percebo como somos diferentes e porque somos diferentes. Não me deixo deprimir pela voracidade das oportunidades que me escapam. Aproveito para visitar “The Art Students League of New York”, ali mesmo ao lado. Já aqui vim várias vezes e sempre me surpreendi com a qualidade dos trabalhos que encontro. Esta escola de elite, florescente no seu edifício oitocentista renovado, lembra-me a “School of the Arts “ da série Fame, que tanto apreciei na minha juventude. Pinturas, esculturas e desenhos expostos no 2º andar, aquele cheiro a carvão e a lápis afiado, um placard com notas, um cavalete esquecido, esta escola tem história e histórias.
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Para concluir o percurso, antes de me recolher para um descanso mais do que merecido, nada como visitar “Columbus Circle”. A comunhão entre o elitismo e o mundano, o sabor do requinte, o toque da distinção tão característico nesta zona da cidade. E surpreendentemente, neste mundo à parte, uma exposição de pinturas alusivas ao mundial de futebol. Um quadro a representar cada um dos países participantes. Portugal lá está e o nosso ícone maior, o insubstituível, o único, o garanhão – Ronaldo, em primeiro plano.
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Pairo agora sobre as nuvens e deixo-me embalar pela vibração que transpira, pelo ruído da chuva que persiste lá fora. Nova Yorque está em mim, faz parte do meu ser.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

“Hey Jude” na Casa Branca

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Na passada segunda-feira, o Presidente Barack Obama atribuiu o mais alto galardão dos Estados Unidos, na área da música popular - “the Library of Congress Gershwin Prize for Popular Song” ao ex-Beatle, Sir Paul McCartney.
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Numa cerimónia que decorreu no East Room da Casa Branca, estiveram presentes várias personalidades ligadas ao mundo da música e do espectáculo; Stevie Wonder, Jonas Brothers, Faith Hill, Emmylou Harris, Lang Lang, Herbie Hancock, Elvis Costello, Jack White, Corinne Bailey Rae, David Grohl e Jerry Seinfeld. Em conjunto homenagearam aquele que é considerado um dos melhores, senão o melhor, “song writer” de todos os tempos, reconhecido pelo seu extraordinário contributo para a música e cultura americanas.



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No seu discurso, Obama não esqueceu de referir a situação delicada no Golfo do México e o quanto está a afectar as populações daquela região. Deixo o discurso do Presidente:
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“We've gone through a difficult year and a half, and right now our thoughts and our prayers are with friends in another part of the country that is so rich in musical heritage -- the people of the Gulf Coast who are dealing with something that we simply had not seen before. And it’s heartbreaking. And we reaffirm, I think together, our commitment to see to it that their lives and their communities are made whole again.
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But part of what gets us through tough times is music, the arts, the ability to capture that essential kernel of ourselves, that part of us that sings even when times are hard. And it’s fitting that the Library has chosen to present this year’s Gershwin Prize for Popular Song to a man whose father played Gershwin compositions for him on the piano; a man who grew up to become the most successful songwriter in history -– Sir Paul McCartney”.

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Este prémio evoca a obra dos compositores George e Ira Gershwin, cuja vasta obra reside na Library of Congress. “The prize is awarded to musicians whose lifetime contributions in the field of popular song exemplify the standard of excellence associated with the Gershwins”.
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quinta-feira, 3 de junho de 2010

Keith Haring

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Curiosamente, e durante muito tempo, pensei que se tratava de uma mulher. Keith Haring soava-me a nome feminino, talvez uma mulher inglesa com alguma idade, dotes artísticos, jeito para o desenho e uma imaginação prodigiosa. Mas não. Keith Haring era um jovem americano, homossexual assumido, dotado de uma capacidade enorme para criar e surpreender.
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Representante da cultura nova-iorquina dos anos 80, artista gráfico, activista, contestatário, pintor de rua, homem do mundo. Keith Haring começou a ganhar notoriedade ao desenhar a giz nas estações de metro de Nova Iorque. Combinando arte, música e moda nas suas obras, rompeu barreiras entre as diferentes áreas e marcou claramente uma cultura urbana de pendor vanguardista.

Haring faz parte daquele grupo de quatro ou cinco artistas que me impressionam. A criatividade e a facilidade com que desenhava, a originalidade e o movimento dos seus desenhos, as cores e a luz... Em tão pouco tempo de vida, produziu uma obra vastíssima e deixou uma marca insubstituível. A sua iconografia é uma mistura de elementos sexuais com discos voadores, pessoas, animais, pirâmides, televisões, telefones; Uma visão particular do mundo que o tornou um dos artistas mais conhecidos do século XX.

“Estudou na Ivy School of Art em Pittsburgh e, mais tarde, na School of Visual Art em Nova Iorque. Conhece Warhol, Basquiat, Hopper e Burroughs, no início da década de 80. Produz vários murais em Nova Iorque, Milwaukee e Tóquio. Esta era uma forma de tornar o seu trabalho acessível ao grande público. Produz desenhos de cena para várias peças teatrais e, em 1989, organiza um projecto que envolveu 300 escolas na pintura de um mural em Chicago. Com o objectivo de apoiar projectos de índole social, fundou a Keith Haring Foundation. As suas pinturas apresentam figuras humanas e animais muito esquemáticos, de cores luminosas, rodeadas por um contorno negro. Com o objectivo de tornar a sua arte disponível a todos, divulga-a através de T-shirts, pins e murais pelo mundo”.
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A sua última obra pública foi realizada em 1989, perto da igreja de Sant'Antonio Abate, em Pisa, Itália - o grande mural intitulado Tuttomondo, dedicado à paz universal.

Keith Haring morreu aos 31 anos de idade, vítima de Sida. Em Fevereiro passado, completaram-se vinte anos desde o seu prematuro desaparecimento.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

O Douro no New York Times

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Recordo-me das palavras do Professor José Hermano Saraiva, quando, num dos seus insubstituíveis programas, viajando pelo país, referiu, com aquela sua convicção de conhecimento e experiência feitos, que qualquer português que se prezasse deveria conhecer quatro locais únicos: Guimarães – o berço da nação e uma referência para a nossa história; Sagres – por ter sido o local inspirador desta empresa imensa que nos orgulha como nenhuma outra, os descobrimentos; a Universidade de Coimbra – símbolo da ciência e do saber e uma referência por ser a Universidade que ao longo de mais de 700 anos formou a elite de Portugal e de todos os países de língua portuguesa e, finalmente, o miradouro da Galafura – um dos miradouros mais bonitos de toda a região duriense, o miradouro de S. Leonardo, onde Miguel Torga “mergulhava” no rio e se embrenhava na paisagem magnânima deste “Doiro sublimado”, a quem num dos seus “Diários” chamou de “excesso de natureza”.
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Tive oportunidade de o confirmar presencialmente. Uma paisagem arrebatadora, uma cor única, uma profundidade imensa e uma beleza particular. De facto, a par dos Açores, uma das regiões mais bonitas de Portugal que é agora documentada no New York Times, deste fim-de-semana, por Frank Bruni- “Portugal Old, New and Undiscovered”.


Uma viagem pela região do Douro que começa na cidade do Porto. Restaurantes, monumentos, vinhos e pratos típicos. Uma apreciação muito positiva da envolvente, que encontra no Douro o seu ponto alto.


“I had been drawn to Portugal by word of how splendid the area around the Douro is. It is from the banks of the Douro that the sublime city of Oporto rises”.

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“The slopes in the foreground were a precipitous, mesmerizing patchwork of greens, reds, browns and grays, the earth alternately craggy and lush, terraced and cleanly diagonal, as if some grand hand had fashioned it into a tutorial on all that nature and agriculture can do. And at the base of those slopes: a ribbon of water, playing peek-a-boo as it twisted into and out of view. This was the Douro River, the cause and compass of my trip”.

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Aproveito para recordar Torga e os seus poemas maravilhosos. Íntimo da região, deslumbrava-se com a paisagem e tão extraordinariamente a eternizou nos seus escritos.
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“O Doiro sublimado. O prodígio de uma paisagem que deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os olhos contemplam: é um excesso de natureza. Socalcos que são passados de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor pintou ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares plausíveis de visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer, e já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza absoluta”. (Miguel Torga - Diário XII)

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“Um poema palavra, espelho desta singular região adjectivada pelo assombro e pela beleza absoluta da paisagem natural engrandecida pela história trágico-telúrica do peculiar herói duriense, escrita nas fragas com a tinta do suor. Um hino à terra. Uma epopeia lavrada paulatinamente no coração do autor. Não tem data. Não nasceu. Foi sendo gerada. O seu antigo companheiro das batidas às perdizes, o Padre Avelino, devoto leitor e amigo do poeta, afirma que lhe tinha custado uma perdiz, que Torga falhou. Justificava-se que naquele momento se lhe estava a desenrolar um poema”.

Um artigo interessante que vale a pena ser lido e que nos deve orgulhar, clique aqui.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Ayrton Senna: O Exemplo da Competitividade

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Assisti na passada semana, casualmente, a um documentário sobre a última corrida de Ayrton Senna. Para surpresa minha, passaram já dezasseis anos sobre a fatídica morte de Senna, na pista Enzo Ferrari, em Imola. Domingo trágico com vários acidentes e duas mortes, Senna e Roland Ratzenberger. Recordo com precisão e clareza este momento triste para os amantes do automobilismo mundial.
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“Na sétima volta a corrida foi reiniciada, e Senna rapidamente fez a terceira melhor volta da corrida, seguido por Schumacher. Senna iniciara o que seria a sua última volta; ele entrou na curva Tamburello e perdeu o controle do carro, seguindo a direito e chocando violentamente contra o muro de cimento. A telemetria mostrou que Senna, ao notar o descontrole do carro, ainda conseguiu, nessa fracção de segundo, reduzir a velocidade de cerca de 300 km/h para cerca de 200 km/h. Os oficiais de pista chegaram ao local do acidente e, ao perceber a gravidade, só puderam esperar pela equipa médica. Senna foi removido do seu carro pelo Professor Sidney Watkins, neurocirurgião de renome mundial pertencente aos quadros da Comissão Médica e de Segurança da Fórmula I e chefe da equipa médica da corrida e recebeu os primeiros socorros ainda na pista, ao lado do seu carro destruído, antes de ser levado de helicóptero para o Hospital Maggiore de Bolonha onde, poucas horas depois, foi declarado morto”.
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Senna constitui uma referência de carácter e firmeza no mundo do desporto automóvel; a sua condução arrebatadora, a sua capacidade para surpreender e a sua coragem para ultrapassar todos os limites são reconhecidas por todos; e a este propósito foi eleito pelos seus pares, em Dezembro de 2009, o melhor piloto de Fórmula I de todos os tempos.
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Senna é também uma referência de dedicação, de perfeccionismo, de destreza e de competitividade. A sua imensa necessidade de vencer constitui um exemplo de vida para todos. Ficarão para a história os duelos entre ele e Alain Prost; em diferentes circuitos lutaram aguerridamente e a força de ambos constitui para mim uma imagem de perseverança que me tem acompanhado em muitos momentos da vida. Não deixa ser comovente ouvir esta entrevista a Alain Prost e perceber como dois rivais quase inimigos conseguiram atingir este nível de relacionamento.
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Recordo com emoção os momentos posteriores à sua morte, em particular, a chegada do seu corpo a São Paulo. Milhões de brasileiros aguardaram-no e milhões de desportistas em todo o mundo despediram-se de Ayrton. “A morte do piloto foi considerada pelos brasileiros como uma tragédia nacional e o governo brasileiro declarou três dias de luto oficial. Também lhe foram concedidas honras de chefe de Estado, com a característica salva de tiros. Estima-se que mais de um milhão de pessoas foram às ruas para ver o seu ídolo e render-lhe as últimas homenagens, sem contar os milhões que acompanharam pela televisão a chegada do avião que trouxe o seu corpo”.
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Na corrida seguinte, no Mónaco, a FIA decidiu deixar vazias as duas primeiras posições no grid de largada, e elas foram pintadas com as cores das bandeiras brasileira e austríaca, em homenagem a Senna e Ratzenberger.

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Para a posteridade ficam recordações como as da prova de Donington Park, em 1993. A imprensa inglesa arrasara a escolha deste circuito para a realização do prestigiado Grande Prémio da Europa, muitas foram as vozes críticas sob o pretexto de que este circuito não permitia ultrapassagens. Deixo estas imagens que são elucidativas.
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"O corpo de Senna está sepultado no jazigo 11, quadra 15, sector 7, do Cemitério do Morumbi, em São Paulo".
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