sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Recessão, Mentiras e Medo

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O Instituto Nacional de Estatística revelou há momentos os números do Produto Interno Bruto português para o quarto trimestre de 2008.

A incerteza, a expectativa e a esperança deram lugar à dura realidade. A economia portuguesa registou o terceiro pior desempenho entre os países membros da União Europeia, com o PIB a contrair 2,1%, em termos homólogos. Portugal ocupa o terceiro lugar, tanto numa análise homóloga, como em relação aos números do trimestre anterior.


Com contracções mais acentuadas que a portuguesa está apenas a Itália, que mostrou uma diminuição homóloga de 2,6% e a Letónia, onde o PIB diminuiu 10,5% (variação não ajustada sazonalmente).


Segundo o Jornal de Negócios, “a queda de 2% no produto interno bruto português (PIB) no quarto trimestre, face aos três meses anteriores, foi a mais intensa desde o primeiro trimestre do ano de 1984, altura em que o FMI teve que intervir. O PIB recuou 2,1% em termos homólogos e 2% contra o terceiro trimestre do ano passado. Esta queda na evolução em cadeia do PIB português é a mais grave desde os primeiros três meses de 1984”.


É verdade que a crise abala praticamente todas as economias desenvolvidas. É verdade que os nossos principais importadores, a Alemanha e a Espanha, caem no quarto trimestre -1,6% e -0,7% respectivamente. É verdade que não existe coordenação ao nível de UE para atacar estes problemas. Mas é verdade também que nos iludiram com anúncios de empresas de sucesso, com referências à solidez da nossa economia, com a solução miraculosa do Magalhães, com a aposta salvadora das relações económicas com as “democracias” da Venezuela, Angola e Líbia, com o “show-off” mediático constante, com o simplex e o plano tecnológico, com a mania de parecermos o que não somos e a necessidade de desviar as atenções para questões laterais e acessórias.

Viveremos iludidos enquanto existir crédito para salvar as empresas que as leis do mercado condenaram à falência, enquanto não formos capazes de replicar dentro de fronteiras os níveis de produtividade que alcançamos no estrangeiro, enquanto não aproveitarmos o conhecimento daqueles que estão mais desenvolvidos que nós, enquanto não tirarmos devido partido da lusofonia e dos milhares de portugueses que se encontram por esse mundo fora e que estarão decerto disponíveis para ajudar o seu país. Viveremos iludidos enquanto a nossa arrogância se sobrepuser à nossa necessidade de aprender, enquanto os interesses pessoais e políticos forem mais fortes do que a necessidade de salvar o país.

Mais do que a recessão, preocupa-me a ausência de alternativas, a inexistência de visão, a descrença relativamente à capacidade político-governativa para ultrapassar as dificuldades. Estou convencido de que o que está em causa, neste momento, é o nosso modelo de desenvolvimento, a nossa estratégia de crescimento, as nossas opções de negócio, as apostas da nossa economia. Vivemos de uma economia com pés de barro, sem sustentabilidade, parasita do estado, sem rasgos de criatividade, sem assomos de coragem. Nestas condições, dificilmente conseguiremos potenciar o crescimento e assegurar uma clara e sustentada melhoria de vida às nossas populações; sem isto continuaremos anémicos e depressivos, mas agora com a agravante tenebrosa da situação económica mundial.

Enquanto a recessão se instala, o poder tentacular do estado agiganta-se para gáudio doentio de algumas forças políticas. O dinheiro flui sem critérios aparentes, os subsídios multiplicam-se em desespero e, enquanto houver financiamento, a nossa sobrevivência adiar-se-á até à agonia final.

Caminhamos para um estádio em que praticamente todos os portugueses passam a ter uma conta corrente com o estado que tudo controla, com o estado que tudo domina, com o estado que tudo agrega e desta forma o medo passará a constituir o denominador comum da nossa sociedade democrática.


Dificilmente imaginei possível que, em pleno século XXI, a qualidade de vida se agravasse a olhos vistos, o produto caísse a pique e acima de tudo, existisse um sentimento de medo e de receio generalizados. Os portugueses hoje sentem medo de falar, receio de se expressarem livremente e pavor de represálias. Perceberam que o poder político instalado é absoluto e se encontra apoiado num sistema de justiça parcial e influenciável.

O país precisa de uma alternativa. Os portugueses exigem uma mudança. Portugal tem que mudar e cabe-nos a todos participar neste processo. Pende sobre o principal partido da oposição uma responsabilidade enorme e uma obrigação imensa. A obrigação de apresentar uma alternativa credível, a obrigação de colocar os interesses dos portugueses à frente dos interesses partidários e pessoais, a obrigação de fazer mais e melhor, a obrigação de não vacilar, a obrigação de não errar e a humildade para trabalhar ao serviço do país e dos portugueses.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Um Desígnio para Portugal

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É com profunda apreensão e crescente preocupação que assistimos à sangria diária de despedimentos que afectam todas as economias, sem excepção. Da imparável economia chinesa até à moribunda economia islandesa, da esperançosa economia americana até à agonizante economia inglesa, da sólida economia alemã até à pálida economia espanhola. Todos sofrem os efeitos da recessão, todos procuram tomar medidas para a combater mas todas se revelam inconsequentes ou paliativas.
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A situação é preocupante, os sinais são aterradores e colocam em perigo a expectativa de crescimento e a evolução do nível de vida das populações, em todo o mundo. Este ano apenas, o desemprego subirá em 30 a 40 milhões e estima-se que o número de desempregados atinja os 500 milhões de indivíduos. Em Portugal, a taxa de desemprego deve já ter superado os 8% e esta situação pode ainda agravar-se até 2010. O governo assumiu finalmente uma taxa de desemprego de 8,5% para 2009 - previsão idêntica, aliás, à da OCDE -, e reconhece assim que o mercado de trabalho vai enfrentar uma das situações mais preocupantes das últimas décadas. “A taxa prevista corresponde ao valor mais alto dos últimos 23 anos, segundo dados da Comissão Europeia, baseados nas definições do Eurostat. Associada a este cenário está a projecção de uma quebra de 0,7% no número de empregados, o que se traduz na perda de pelo menos 36 mil postos de trabalho.”

Nem a mão protectora do estado, nem a dinâmica dos mercados parecem conseguir salvar as famílias deste drama dos tempos presentes. Os governos desdobram-se em pacotes, multiplicam-se em programas, disparam os incentivos mas, infelizmente, a sensação de retrocesso temporal, de regressão dramática em termos de ideais, de objectivos, de qualidade de vida, de expectativas, constituem uma realidade inexorável.

Os últimos dias em termos meteorológicos não parecem ajudar. A chuva permanente, o nevoeiro constante, a escuridão depressiva contribuem para um estado de espírito desesperante. Parece que não existe esperança, parece que se instalou uma resignação doentia e continuada e que o futuro deixou de constituir uma fonte de ilusões de progresso e passou a apresentar-se como um pesadelo de desassossegos.

Curiosamente num cenário como este é cada vez mais notória a incapacidade, a inconsequência, a irrelevância, o total alheamento que transmitem os nossos responsáveis políticos. Por cá discute-se tudo menos as medidas, as propostas, as opções para combater a “peste bobónica” que se instalou.

O caso Freeport domina as notícias e ajudou a instalar a desconfiança, a absoluta ausência de credibilidade, a aldrabice, a tentativa de ludibriar, a preocupação com a imagem, a gestão meticulosa da informação. Vale tudo para continuar no poder, todos os argumentos são válidos, para tudo existe uma desculpa, para tudo existe um lado positivo, um lado rosa. Infelizmente, a inconsequência e a parcialidade ficaram bem patentes e são cada vez mais uma evidência do nosso sistema de justiça.

Os desígnios que se colocam para os próximos quatro anos são a nova proposta de regionalização e o casamento dos homossexuais. No primeiro caso, mais uma vez, a tentativa de formalizar uma realidade burocrática que asfixia o país agora sob a forma de regiões e poderes locais; barões e baronetes paroquiais de olhos postos no seu umbigo e apaniguados políticos de terceira categoria. No segundo caso, uma questão social eleita ícone de marketing politico e utilizada, pura e simplesmente, para fazer face a interesses partidários irresponsáveis e de curto prazo.

Mas infelizmente, a nossa classe politica personifica um deserto de ideias, uma ausência total de desígnios, uma total incapacidade para inovar, um comodismo transversal. É confrangedor assistir a debates na Assembleia da República. O circo da democracia levado ao expoente máximo da hilariedade, da incompetência e do interesse próprio. Surpreende-me a falta de preparação, a ausência de profissionalismo, as temáticas debatidas pela rama, a ausência de alternativas, a massificação dos “sound bytes” inconsequentes, a pequena política, a conversa de café.

Onde estão os desígnios nacionais? Quem nos pode transmitir confiança, força, segurança e esperança no futuro? Onde está a garra para construir, a vontade de arregaçar as mangas e trabalhar? Onde estão os programas efectivos e consequentes para combater a crise social? Onde estão as soluções do estado para empregar pessoas, para dar trabalho? António Barreto no seu último artigo do Público faz sugestões curiosas de medidas, tipo “New Deal” para combater a crise.

É necessário criar as condições para que o mercado funcione, é necessário repensar o nosso modelo económico, é necessário requalificar o nosso tecido industrial, apostar na qualificação dos nossos recursos e promover o empreendorismo.
Os Estados Unidos vão lançar um colossal programa de investimentos públicos em simultâneo com uma redução significativa da carga fiscal actuando assim, ao nível da oferta e da procura. A Europa deve acompanhar estas medidas, deve tirar lições da crise Japonesa dos anos 90, repiscar algumas das medidas do “New Deal” de Roosevelt e por último, exigir mais e sempre mais dos seus políticos e do regime político que escolheu como seu – a democracia.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Diplomacia Inteligente

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(Deixo o meu artigo publicado este fim de semana no Semanário Sol)

Apesar dos oito graus negativos do passado dia 20, milhares de pessoas assistiram à cerimónia da tomada de posse do novo Presidente Americano. Os relvados amarelecidos do Mall, a Pennsylvania Avenue e Lafayette Square transbordavam de vida, de entusiasmo e, acima de tudo, de esperança e de expectativa em relação ao futuro.

Nunca na história do mundo se esperou tanto de um só homem e da sua capacidade para governar e conduzir uma nação. Obama tem uma responsabilidade gigantesca perante os americanos e, curiosamente, perante o mundo que o admira, que o observa e que o copia.

Acabámos de entrar num novo começo (“a new begining”); a partir daqui os americanos vão inaugurar uma nova forma de fazer diplomacia, uma nova forma de gerir a imagem, uma nova atitude perante o mundo e uma nova forma de lidar com os seus aliados. Hillary Clinton denominou esta nova postura como “smart power” por oposição ao “hard power” de George W. Bush. Esta não é uma classificação nova, foi referida pela primeira vez por Suzanne Nossel na revista Foreign Affairs em 2004 e é também defendida por variados pensadores políticos, como Joseph S. Nye, Jr., Professor de Relações Internacionais na Universidade de Harvard. Os livros, filmes, canções, ideais, diplomacia e autoridade moral por oposição às armas, bombas, tanques, e sangue.

Hillary, na sua audição perante o Comité de Relações Internacionais do Senado, referia justamente a necessidade de utilizar todas as ferramentas ao seu alcance; diplomáticas, económicas, militares, politicas, legais e culturais para, em combinação ou isoladamente, as adaptar da forma mais adequada a cada situação. Referia, em súmula, que “with smart power, diplomacy will be the vanguard of our foreign policy”.

A Secretária de Estado teve a humildade de reconhecer aquilo que é uma evidência para o mundo e que se acentuou de forma significativa com o autismo e a obsessão ideológica da anterior administração. A América não pode ter a pretensão de resolver os problemas do mundo sozinha, nem de querer impor ao mundo a sua vontade e a sua maneira de estar, mas o mundo também não pode querer resolver as suas dificuldades sem a participação dos Estados Unidos.

Constitui uma evidência que os Estados Unidos foram bem sucedidos sempre que lideraram coligações com desígnios comuns e consensuais. Um trabalho bem feito nesta matéria permitiu aos Americanos consolidarem o seu prestígio como um referência para a segurança mundial e, acima de tudo, garantia da democracia e da liberdade. Este património foi delapidado pela administração cessante. As circunstâncias, é certo, foram muito particulares. O 11 de Setembro abriu uma ferida com consequências tremendas para o povo americano que justificou muito dos esforços iniciais mas que a partir de determinada altura serviu para alimentar uma vendeta idiológica incontrolável.

A actual crise mundial constitui um exemplo desta evidência. Todos os países, sem excepção aguardaram e aguardam com expectativa e esperança as decisões da nova administração. Obama tem aqui uma oportunidade magistral de definir as regras, estabelecer os objectivos e assumir uma visão para o futuro que será certamente seguida por todos. A União Europeia constitui aliás, o exemplo vivo desta realidade, com os principais protagonistas a aguardarem que os Estados Unidos definam o rumo a seguir.

A aposta numa diplomacia inteligente, mais do que uma politica alternativa ou uma estratégia inovadora, constitui uma necessidade e uma obrigação para esta Administração. A crise financeira e a situação extrema a que chegou a economia americana obrigam a reduções significativas de gastos, em termos da defesa, e a uma optimização profunda das forças, em cenário de guerra.

Em 2007 apenas, os gastos do Departamento da Defesa chegaram a $500 biliões de dólares, excluindo os gastos com a guerra no Irão e no Afeganistão. A manutenção numa base permanente de um exército de 1,5 milhões de homens e o crescimento continuado da indústria da defesa contribuem para que estes números representem cerca de 40% a 50% dos gastos militares do mundo.

É fundamental rever esta situação sem colocar em perigo a segurança nacional, a luta contra o terrorismo ou os valores que suportam a democracia americana. Vai ser necessário rever o modelo de relacionamento com aliados e adversários, repensar o papel da Nato e reequacionar o equilíbrio de forças e o processo de decisão do Conselho de Segurança das Nações Unidos.

Alterações a este nível implicam impactos profundos e riscos acrescidos. É necessário considerar o impacto financeiro sobre a indústria do armamento, a redução do emprego militar, a necessidade de partilhar informação classificada, a necessidade de aumentar o investimento em investigação militar de ponta e, possivelmente a maior das dificuldades, a necessidade de confiar em amigos e aliados. Mas os resultados esperados podem ser grandiosos; reduções significativas do orçamento de defesa, melhoria das relações com aliados, melhor aceitação internacional em caso de acções militares no estrangeiro, melhor conhecimento e solidariedade da opinião pública mundial e maior coordenação e eficiência no campo de batalha.

Vivemos hoje num ambiente global. A globalização aproxima-nos cada vez mais e, por essa razão, este constitui o momento ideal para utilizar a diplomacia em vez da força, a inteligência em vez da teimosia, o tacticismo em vez do unilateralismo.