quarta-feira, 26 de maio de 2010

As Mulheres de Beryl Cook

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Na próxima Sexta-feira completam-se dois anos desde a morte de Beryl Cook. Nascida em Inglaterra, no ano de 1926, só começaria a pintar mais de quarenta anos depois. Uma autodidacta por natureza; amante da pintura e do desenho, apaixonada pelo teatro e pelo mundo das artes. Viajou muito e passou por muitos países que a inspiraram, mas foi em Plymouth que se refugiou e viria a produzir a grande maioria dos seus trabalhos.

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Durante os meses de Verão com a ajuda do seu marido geria uma pousada e era nos meses de Inverno que se dedicava com maior afinco à pintura, reproduzindo as imagens das paisagens que a impressionavam, na região. Até ao dia em que, persuadida por um amigo antiquário, lhe forneceu algumas das suas obras para venda. Foram um sucesso e, a partir daí, a sua ascensão nunca mais parou, tornando-se numa das mais amadas e reconhecidas pintoras da Grã-Bretanha.
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“Cook was a shy and private person, often depicting the flamboyant and extrovert characters she would like to be. She had an almost photographic memory. She found new material for her work while travelling. Early local scenes expanded those depicting Buenos Aires, New York, Cuba, Paris and Barcelona”.

Beryl Cook ficará para sempre associada às mulheres arredondadas e robustas que povoam os seus quadros. Ambientes soturnos e sombrios, prostitutas e marinheiros, bares alternativos, sempre pintados não pelo seu lado soturno, mas antes pela sua forma burlesca. Foi classificada por alguém como uma "Rubens with jokes".
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terça-feira, 25 de maio de 2010

Margem Sul – “State of Mind”

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É conhecido o estigma que existe relativamente à “Margem Sul” do Tejo; o outro lado do rio, o “south bank” de Lisboa, a zona reaccionária ligada ao operariado, um feudo tradicional do partido comunista, um verdadeiro “melting pot” à portuguesa. Trata-se efectivamente de um imenso dormitório para muitos que trabalham na zona de Lisboa ou na coroa urbana da cidade, uma zona que enche durante a noite, desertifica durante o dia e fervilha ao fim de semana.

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Associadas a quase todas as grandes metrópoles existem sempre uma ou várias cidades- satélite, que funcionam como urbes habitacionais de apoio às mesmas. Assim acontece com a Margem Sul do Tejo, à semelhança do que sucede, por exemplo, com a zona de Queens, em Nova York ou o "south bank" londrino que se tem desenvolvido significativamente nos últimos anos e, por isso, é quase um caso à parte. A Margem Sul, já chamada de deserto por um megalómano que por acaso era Ministro, constitui efectivamente uma realidade à parte, uma bolsa de humanidade onde pululam verdadeiros representantes do português típico; fato de treino ao fim de semana, beata no canto da boca e barba por fazer.

É por isso notório um certo preconceito social, cultural e económico em relação aos habitantes desta zona. Com maior ou menor fundamento é um facto indiscutível que em muitas destas áreas os índices de violência, os conflitos raciais, a degradação urbanística contribuem para essa imagem. Não é menos verdade que aí reside também uma classe média com alguma formação que teve acesso ao “boom” do ensino superior, à melhoria das condições de vida, à explosão do consumo. É também verdade que os últimos anos se têm pautado por maiores preocupações de ordenamento urbanístico, pelo aproveitamento de espaços verdes e por investimentos em infra-estruturas e espaços culturais.


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A este propósito, um amigo, que por sinal vive na Margem Sul, enviou-me este clip, paródia do original de "Alicia Keys – Empire State of Mind", que já aqui deixei. Repleto de ironia, sarcasmo e originalidade:
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segunda-feira, 24 de maio de 2010

Memorial do Despesismo

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“Saiba vossa majestade que, haver, havemos cada vez menos, e dever, havemos cada vez mais”. (José Saramago, Memorial do Convento)
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Não deixo de me surpreender com a intemporalidade da nossa História e com a actualidade de algumas das suas personagens. Se é certo que muitos autores nas suas obras romanceadas libertam a imaginação e dão largas à criatividade, não é menos verdade que algumas destas obras revelam grande proximidade da realidade.
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Eça de Queiroz revela uma mestria superior ao retratar Portugal e os portugueses. Descreve e caricatura magistralmente o espírito do português; a pequenez, a inveja e a mediocridade. Mais recentemente, Saramago, no Memorial do Convento alcança resultados similares. Recorrendo ao romance histórico, revela-nos traços de carácter, condutas, personagens, demonstrações de vontade, apreciações espirituais, características do século XVIII, mas que se conseguem transpor, quase na totalidade, para os tempos actuais.

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A este propósito, tive oportunidade de assistir, este fim-de-semana, a uma peça de teatro, no Convento de Mafra, baseada na obra de Saramago. Em conjunto com um grupo de alunos do Colégio Luso-Francês do Porto, pude despertar para as semelhanças flagrantes e para a afinidade desconcertante de muitos aspectos retratados, com os tempos presentes e os figurantes actuais. Através da contraposição de dimensões, Saramago faz uma crítica à sociedade da época que se aplica quase na perfeição ao nosso Portugal de 2010.
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Segundo refere Ana Margarida Ramos, na obra “Memorial do Convento - da leitura à análise”: “Rei de Portugal de 1706 a 1750, D. João V é o símbolo do monarca absoluto, vaidoso, megalómano, egocêntrico que quer deixar como marca do seu reinado uma obra grandiosa e magnificente - o Convento de Mafra. Este é construído sob o pretexto de que cumpre uma promessa feita ao clero, classe que "santifica" e justifica o seu poder”.


Primeiro-ministro de 2005 a 2010, José Sócrates é o símbolo do poder autista, megalómano, egocêntrico e incompetente que quer deixar como marca do seu mandato várias obras desnecessárias e onerosas como o TGV e a terceira travessia sobre o Tejo. Construídas sob os auspícios do “keynesianismo” descabelado e do aproveitamento dos fundos europeus, acabarão por constituir a fonte das nossas misérias e a bênção final da nossa agonia.


“D. João V queria construir uma basílica de S. Pedro em Lisboa, mas o arquitecto de Mafra, que foi chamado pelo rei, João Frederico Ludwig, aconselhou-o a não construir a basílica, porque demorava muito tempo a construir e D. João V poderia já não estar vivo quando acontecesse a inauguração desta. Então o rei decidiu aumentar o convento de Mafra de oitenta para trezentos frades, e assim foi. O projecto é, sem dúvida, ambicioso demais para os recursos do reino, o que se reflecte em conversa, imaginada pelo narrador, entre o rei e o almoxarife ou guarda-livros. Então começaram as obras, mas depois o rei decidiu que a inauguração do novo convento seria no dia dos seus anos, que calhava num domingo, daí a dois anos; após essa data, o seu próximo dia de anos, que calhasse num domingo só seria daí a dez anos e poderia ser muito tarde”. Como dois anos seria pouco tempo para a construção do novo convento, D. João V decidiu inaugurá-lo, com aparato e folclore, muito antes deste estar concluído.
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José Sócrates queria construir 3 eixos ferroviários para o TGV, um novo aeroporto, variadas auto-estradas, a terceira travessia, mas o peso das dívidas, a pressão da opinião especializada, a influência dos credores obrigaram-no a recuar, uma vez que as consequências poderiam ser calamitosas. Então o Primeiro-ministro optou por aguardar por melhores dias, mas sempre com a obsessão de concretizar as obras. Algumas foram mesmo adjudicadas e, uma vez que demorariam a ser concluídas e a probabilidade deste Primeiro-ministro já cá não se encontrar ser elevada, decidiu-se fazer uma festa pomposa e mediática para lançamento da primeira pedra, em que se despenderam fortunas em tendas, luzes e multimédia.
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Na obra de Saramago há dois grupos antagónicos: “a classe opressora, representada pela aristocracia e alto clero, e os oprimidos, o povo, encarnado em Baltasar e Blimunda”. No nosso caso, para o primeiro grupo destaca-se a actuação do Primeiro-ministro e da classe política, enquanto que no segundo, temos o povo, que continua oprimido e subjugado na actualidade.
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A perseguição e a opressão dos que se destacam, tão presentes na nossa sociedade, estão também retratadas na obra, através do padre Bartolomeu de Gusmão, perseguido pela Inquisição, como resultado da modernidade do seu espírito científico e da sua ousadia intelectual. Os espíritos livres e independentes, os líderes de opinião e os desalinhados do carneirismo militante de hoje são retratados pelo maestro Domenico Scarlatti que, pela liberdade de espírito e pelo poder subversivo da sua música, é uma figura incómoda para o Poder.

Felizmente, temos tido quem nos retrate bem. Infelizmente, a caricatura mantém-se mais ou menos inalterada com o passar dos anos. O que nos falta é alguém que nos desenhe de novo...

Deixo um excerto da obra, que é revelador da actualidade da mesma:

"Então diz-me lá como estamos de deve e haver. O guarda-livros leva a mão ao queixo parecendo que vai entrar em meditação profunda, abre um dos livros como para citar uma decisiva verba, mas emenda ambos os movimentos e contenta-se com dizer, Saiba vossa majestade que, haver, havemos cada vez menos, e dever, devemos cada vez mais, Já o mês passado me disseste o mesmo, E também o outro mês, e o ano que lá vai, por este andar ainda acabamos por ver o fundo ao saco, majestade, Está longe daqui o fundo dos nossos sacos, um no Brasil, outro na Índia, quando se esgotarem vamos sabê-lo com tão grande atraso que poderemos então dizer, afinal estávamos pobres e não sabíamos, Se vossa majestade me perdoa o atrevimento, eu ousaria dizer que estamos pobres e sabemos, Mas graças sejam dadas a Deus, o dinheiro não tem faltado, Pois não, e a minha experiência contabilística lembra-me todos os dias que o pior pobre é aquele a quem o dinheiro não falta, isso se passa em Portugal, que é um saco sem fundo, entra-lhe o dinheiro pela boca e sai-lhe pelo cu, com perdão de vossa majestade, Ah, ah, ah, riu o rei, essa tem muita graça, sim senhor, queres tu dizer na tua que a merda é dinheiro, não, majestade, é o dinheiro que é merda, e eu estou em muito boa posição para o saber, de cócoras que é como sempre deve estar quem faz as contas do dinheiro dos outros". (José Saramago, Memorial do Convento)

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Comissão de Descrédito

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Nas últimas semanas, em paralelo com as mudanças no mundo, segundo o nosso Primeiro, decorreram os trabalhos da Comissão de Inquérito para apurar se o Primeiro-ministro de Portugal mentiu ao parlamento. Portanto, nas últimas semanas dezenas de deputados têm gasto rios de dinheiro em audições, análise de documentação, análise de escutas, com o propósito de provar uma evidência que se encontra há muito demonstrada. Temos um Primeiro-ministro que mente compulsivamente, quer seja no parlamento, no governo, na televisão, nos jornais. Creio que esta é uma realidade já mais ao menos aceite por todos, uma certeza que reflecte o espírito do nacional porreirismo tão embrenhado.

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A evidência mais flagrante destas semanas e os acontecimentos de ontem provam-no claramente, é a irrelevância e a inconsequência deste tipo de Comissões. Grande aparato, grande mediatismo, revelações bombásticas, mas resultados nulos. Para serem efectivas e consequentes, estas Comissões deveriam ter poderes acrescidos, deveriam funcionar de outra forma; mais incisiva e mais intimidatória, menos “polite”. As audições realizadas são elucidativas; profundamente amadoras, mal preparadas e carregadas de informalismo e de salamaleques, do lado dos inquiridores. Ostensivas, irónicas, lúdicas e mentirosas, do lado dos inquiridos.
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Por contraponto, assistir a Comissões de Inquérito, nos Estados Unidos, impressiona-nos pelo rigor, pela severidade, pela autoridade e sobretudo pela preparação dos intervenientes. Conforme escreveu o meu amigo António Botelho de Melo, no Blog Ma-Schamba, “Até na geografia das salas se nota esse informalismo latino: as salas de audiência americanas estão configuradas como salas de tribunal, em que os legisladores se sentam mais alto, mesmo em frente aos inquiridos. Nas audiências parlamentares portuguesas, acotovelam-se legisladores e inquiridos uns em cima dos outros, em redor de uma mesa pequerrucha, e há uma figura qualquer a presidir à sessão, a que todos, caninamente, chamam “sôr presidente”. Que ainda por cima senta-se mesmo ao lado dos inquiridos”.
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Nada como assistir às inquirições a Richard Fuld, o todo poderoso presidente do defunto do Lehman Brothers ou às mais recentes realizadas aos executivos da Goldman Sachs, para percebermos esta realidade. São estas situações e estas evidências que fazem toda a diferença. É por isso que somos o país que somos, é por isso que vivemos numa sociedade de medíocres, onde a impunidade e a inconsequência nos avassalam. É por isso que temos um Primeiro-ministro como o actual que despreza as instituições, desrespeita os portugueses; sem ética, sem princípios, sem moral.
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quinta-feira, 20 de maio de 2010

(-) Soberania (+) Responsabilidade

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As últimas semanas têm sido trágicas para Portugal e de uma forma geral para toda a União Europeia. Não posso estar mais de acordo com o nosso Primeiro quando se refugia na afirmação de que o mundo mudou, mas contrariamente ao que ele refere, não mudou na última semana ou nas últimas semanas. O mundo mudou quando o sistema financeiro americano se desmoronou em 2008 com a crise do “subprime”, a falência do Lehman Brothers e a asfixia da AIG.
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Desde então a situação tem vindo a agravar-se de forma significativa; a liquidez e o acesso ao crédito restringiram-se, as economias estagnaram, a incerteza e a expectativa instalaram-se. As empresas primeiro, e alguns países, mais tardiamente, compreenderam que era necessário mudar de postura, alterar os hábitos instalados e as estratégias assumidas. :

A União Europeia como sempre reagiu tarde. Na altura, curiosamente, Gordon Brown assumiu um papel importante e consequente para acalmar os mercados e manter a serenidade. Desde então pouco ou nada foi feito, ou pelo contrário muito se fez mas na direcção errada. Os países, face ao clima de instabilidade decidiram injectar dinheiro na economia; aumentar o investimento público, fazer de motor económico com o propósito de segurar as economias despedaçadas. Desta forma potenciaram os seus deficits muito para além das suas reais capacidades de pagamento e até ao limite, em alguns casos, do impensável.:


O caso de Portugal é flagrante, um conjunto de políticas erradas, um modelo económico desfasado e uma incapacidade para tomar decisões difíceis, em termos de redução de custos e controlo da despesa. A aposta continuada e obstinada no consumo público e em políticas ditas “keynesianas”, a total ausência de controlo sobre os gastos e a urgência da sua redução, a par da ilusão do crédito ilimitado, constituíram um caldo explosivo que nos conduziu à situação actual. Tudo envolto num embrulho de incompetência, teimosia, inconsequência e falta de ética.

Neste momento estou convencido que somos governados por um bando de incompetentes descoordenados e liderados por um demente que vive num mundo imaginário, um mundo de ficção, completamente alheado da realidade.
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Espero que esta fase, extremamente difícil para a Europa, constitua um factor de mudança em termos da criação de um governo e de uma politica financeira europeia. Temo que a perda de soberania e a redução dos poderes de decisão constituam o único caminho para que se passem a tomar decisões mais concertadas, para que se assegure um maior controlo sobre a dívida e para que as diferentes governações possam ser mais isentas, consequentes e eficazes.