É sempre com enorme carinho e imensa saudade que recordo os Açores. A distância aproxima-nos, a ausência aguça a memória, o tempo agiganta a recordação.
Volto de quando em vez e sempre menos do que gostaria. Mas é com preocupação que, à distância de uma lembrança, assisto à voracidade do seu desenvolvimento, à avidez da sua transformação, à sede do seu progresso.
Uma luta permanente entre homem e natureza, sempre em detrimento do segundo, uma conquista fácil do betão para benefício do turismo, uma avalanche de transformações para repasto do desenvolvimento.
Sinto que os Açores estão diferentes; sinto-os menos rurais e mais citadinos, sinto-os menos verdejantes e mais policromáticos, sinto-os menos azuis, sinto-os menos rudes e mais sofisticados, sinto-os menos exuberantes e mais uniformizados, sinto-os menos especiais e com menos personalidade.
E não será a mais valia dos Açores precisamente a sua rudeza? As suas gentes? A sua topografia? As suas aldeias de basalto e os seus lugarejos de ausência? A sua vegetação luxuriante? As pontes estreitas que aproximam desfiladeiros imensos lá para os lados do Nordeste?
Paisagem de cores pensativas e quietas, que nos afastam de um mundo de febre e de vertigem. À primeira curva da estrada, o olhar reencontra campos de pastagens, as vacas dispersas a aguardar mais uma recolha de leite. Muito dificilmente se apaga da memória a diversidade de tons verdes, através dos campos, das matas, dos vales e das encostas. “Perduram vestígios de eras remotas, cicatrizes de convulsões sísmicas, a morfologia vulcânica da ilha. Ainda e sempre o mistério das origens, na evidência dos sinais”. São estas as características que os turistas procuram, são estes os Açores da minha memória.
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A indústria do lazer constitui, actualmente, uma realidade em grande ascensão e desenvolvimento, em todo o mundo. De facto, nos tempos modernos uma das preocupações mais evidentes, das populações mais desenvolvidas, é de como ocupar os tempos livres. Esta preocupação explica o crescimento exponencial verificado com o sector do turismo que em 1999 atingiu o valor histórico das 657 milhões de chegadas.
Segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT), Portugal ocupa o décimo quinto lugar no ranking dos países receptores de turistas com 11,6 milhões de turistas por ano. Neste cenário, os Açores ocupam um lugar menor mas com níveis de crescimento consideráveis nos últimos anos, e acima de tudo, perspectivas verdadeiramente ambiciosas para os próximos; espera-se uma duplicação da capacidade de oferta em 3 anos. O arquipélago deverá passar por uma verdadeira revolução turística que transformará, radicalmente, o meio tal como o conhecemos actualmente.
Tendo em conta este cenário de mudança devem-se colocar várias questões pertinentes:
Qual a capacidade de suporte da região, em termos de investimento turístico, sem danificar a natureza e os ecossistemas?
Será que se procedeu a um planeamento turístico detalhado que acautelasse as riquezas naturais, sociais e ambientais da região?
Estarão os Açorianos preparados para esta mudança que se avizinha?
Será que o mercado já compreendeu que a dimensão da região não lhe permite concorrer em quantidade mas antes em qualidade?
Será que os Açorianos e, em particular, a burguesia empreendedora têm consciência da necessidade de preservar a riqueza natural e humana dos Açores?
O crescimento e o desenvolvimento constituem, fortuitamente, uma inevitabilidade das economias de mercado e uma consequência natural das democracias modernas, por isso mesmo, a geração de riqueza é essencial para o aumento do nível de vida das populações. Mas o crescimento quando não planeado pode, facilmente, atingir proporções contraproducentes e prejudiciais para o meio e para as gentes.
Não podemos descurar o impacto profundo do turismo no ambiente, a possível descaracterização do meio, o aumento descontrolado da densidade populacional, a rápida escassez dos recursos, o desrespeito pelo ambiente, a utilização das paisagens até níveis próximos da exaustão.
O planeamento cuidado, a preocupação com o ambiente através do dimensionamento adequado da oferta, a diferenciação pela qualidade do produto oferecido, a qualificação pela formação profissional disponibilizada, são aspectos essenciais que não podem ser descurados.
Os Açores devem apostar num desenvolvimento sustentável, ou seja, crescer mas através de uma interacção perfeita e controlada com o meio.
O termo Desenvolvimento Sustentável define um conceito defendido pelas Nações Unidas, mais concretamente pela Comissão para o Ambiente e Desenvolvimento. De acordo com a ONU, “desenvolvimento sustentável significa satisfazer as necessidades da população actual, sem comprometer a capacidade das futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades”.
Esta definição reflecte o problema que a insustentabilidade do desenvolvimento mundial acarreta. Com o constante crescimento da população tem-se assistido ao aumento da procura de recursos, como a água, a energia e o solo. Por outro lado, a globalização da economia tem aumentado os hábitos de consumo, potenciando a produção de resíduos e multiplicando a mobilidade da população. A sobre-exploração dos recursos naturais, tem sido tão elevada que estes começam a entrar em ruptura.
Perante este quadro muito pouco abonatório, a solução preconizada por muitos países e regiões, aponta para um desenvolvimento sustentável.
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Energias renováveis: A utilização de energias renováveis visa, essencialmente, reduzir a pressão sobre recursos escassos. Outro factor relevante incide no grau poluente das energias renováveis que é muito inferior ao das energias convencionais.
Eficiência na mobilidade: Este ponto pressupõe a existência de estudos destino-origem, por forma a definir trajectos óptimos e soluções (ex: transportes públicos) que minimizem o volume de deslocações e o seu impacto ambiental.
Tratamento e reutilização de águas: Consiste na problemática da escassez de água potável, ou seja, a racionalização do consumo e a reutilização da água.
Tratamento e reciclagem de resíduos: Este penúltimo ponto baseia-se na teoria dos “3R”, reduzir, reutilizar, reciclar.
Participação da população: É o ponto chave de todo um desenvolvimento sustentável. Aqui reconhece-se a importância da população para um futuro sustentável, pois terá que partir da própria população a aplicação de todos os princípios atrás mencionados. Se assim não for, as políticas de incentivo para aplicação de todas as recomendações não terão qualquer efeito. Se a população se sentir parte integrante deste processo, sentindo que a sua opinião é válida, todas as políticas terão o seu resultado potenciado e reconhecido num prazo significativamente mais curto.
1 comentário:
Gostei muito do texto... Partilho completamente a visão de como deve ser promovido o turismo nos Açores!... Ainda só conheço uma ilha, e este ano, se tudo correr como planeado, conhecerei mais duas, mas posso dizer, do que vi, que deve ser dificil encontrar outro sitio no mundo que nos transmita tanta tranquilidade e que tenha o poder de nos fortalecer a alma como aconteceu comigo...
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