terça-feira, 18 de novembro de 2008

“The Big Three”

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Neste momento o Congresso discute a possibilidade de as três grandes produtoras de automóveis americanas receberem um “bailout”. Depois da AIG, da Fanny Mae e Freddy Mac e depois do bodo generalizado à banca em dificuldade, é a vez da General Motors, da Ford Motor e da Chrysler estenderem a mão para receberem dólares frescos, ao que parece essenciais à sua sobrevivência.

Ao ouvir Barney Frank, congressista democrata responsável pelo Comitê Financeiro do Congresso, de origem açoriana, homosexual assumido, não necessariamente por esta ordem, na CNN ontem à noite, ficou clara que a posição democrata vai no sentido de mais um "bailout". Obama, na sua entrevista ao programa "60 Minutes" revelava também a sua preocupação com a indústria automóvel e a necessidade de a ajudar.

As opiniões são, mais uma vez, bastante díspares e distantes, existindo um grupo alargado de congressistas e destacados economistas contra esta ajuda e um grupo de congressistas e destacados economistas a favor deste "bailout". Estamos, pois uma vez mais, perante um impasse e a necessidade de assumir uma posição não necessariamente fácil. Barack Obama tem aqui um dos primeiros testes à sua resistência, à sua fibra e à sua capacidade para enfrentar interesses instalados e tomar decisões difíceis. Acredito que a firmeza da decisão que daqui resultar, a clareza das suas condições, a eficiência da sua aplicabilidade podem ser decisivas para esta administração iniciar o seu mandato e constituirão, seguramente, uma referência para as decisões que se irão seguir.


A situação é profundamente preocupante e ameaçadora. A economia americana entrou em recessão assumida, os mercados continuam a sua trajectória descendente, a crise financeira contamina as restantes economias industrializadas com o Japão na primeira linha. Os governos parecem desnorteados e impotentes, os economistas procuram semelhanças com crises anteriores, mas têm dificuldade em encontrar soluções para as dificuldades actuais. As cimeiras sucedem-se e as empresas continuam a fechar, a taxa de desemprego sobe (só em Portugal parece que desceu 0,2% e logo o nosso primeiro desatou a atirar foguetes). O papel do estado, a vitalidade do mercado livre e as virtudes do liberalismo económico estão sobre a mesa. É tempo de repensar paradigmas, reavaliar conceitos e tomar decisões difíceis.


Não podemos deixar de analisar as várias razões que conduziram a indústria automóvel à encruzilhada actual. Ao discutir a tomada de medidas de ajuda, é preciso não esquecer a trajectória suicida que estas empresas vinham registando nos últimos anos. Há cerca de 10 anos estas empresas detinham 70% das vendas nos Estados Unidos, neste momento, estas não chegam aos 47%.


Autismo tecnológico, crença na intemporalidade dos combustíveis baratos, em particular do petróleo, falta de flexibilidade, acomodação, queda continuada de quota de mercado, dificuldade em mudar de hábitos, acordos laborais blindados, custos astronómicos com seguros de saúde (no Japão o sistema de saúde dos funcionários automóveis é pago pelo estado), milhares de reformados e respectivas famílias a agravar os custos, custos fixos elevadíssimos e profundamente inflexiveis e a óbvia crise económica que devasta economias e arruina poupanças em todo o mundo: estas são algumas das razões para a actual situação, por isso mesmo, estas empresas devem ser responsabilizadas e as decisões dos seus gestores julgadas criminalmente.

A possibilidade de falência recorrendo ao “Chapter 11” e não ao “Chapter 7” parece-me a solução mais acertada. No primeiro caso, as empresas declaram falência mas continuam a operar com restrições e com um projecto de recuperação em execução; no segundo caso, fecham pura e simplesmente e os seus activos são vendidos para ressarcir os credores em melhor posição.

O fantasma da falência, apesar dos riscos elevadíssimos que comporta, pode constituir uma solução radical para corrigir uma situação de clara ineficiência de mercado. Esta alternativa, em conjunto com uma intervenção restrita e criteriosa do estado, contribuiriam para a reestruturação e revitalização destas empresas e permitiria uma reorganização deste mercado, com a possível fusão das actuais companhias.

Estamos, claramente, perante uma ruptura com o passado e com os vícios antigos e uma aposta no futuro, na inovação, na eficiência e no mercado, tão apregoados por Obama na sua campanha democrata.

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