terça-feira, 24 de novembro de 2009

“Capitalism: A Love Story”


Participei ontem na ante-estreia do último filme de Michael Moore, “Capitalism: A Love Story”. Tratou-se de uma iniciativa inédita mas muito interessante da Universidade Católica, que convidou o Professor João César das Neves e o jornalista do Expresso, Nicolau Santos para um debate relativo ao filme em questão.
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Sala cheia, muitos estudantes e professores, antigos alunos e alguns “outsiders”, todos preparados para assistir a mais uma catarse mental deste contestatário militante. Efectivamente tratou-se de mais um dos filmes a que já nos habituou Moore, neste caso o seu quinto filme com algum relevo. Michael Moore especializou-se na contestação ao modelo de desenvolvimento americano dos últimos vinte anos e para isso leva a demagogia ao extremo, dramatiza, utiliza meias verdades, ilude, exagera e sobretudo aproveita-se de situações pessoais delicadas e sensíveis para veicular uma mensagem errónea e imperfeita.
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Em “Capitalism: A Love Story” a receita é a mesma de sempre, só que desta vez o focus é a crise financeira global de 2007/2009, a transição do governo de George W. Bush para Barack Obama e o pacote de estímulo à economia, sancionado pelo último.
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O propósito é destruir o conceito de capitalismo e culpá-lo por todos os males e por todas as desgraças que têm acontecido nos últimos anos. A crise do desemprego, os vorazes mercados financeiros, as selváticas companhias de seguros, a ausência de redistribuição da riqueza ou a insensibilidade do capital.
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Recorrem-se a exemplos chocantes de situações mal contadas ou direccionadas num determinado sentido e com um objectivo claro. Por exemplo, o caso das multinacionais que faziam seguros de vida para os seus funcionários e o relato de algumas situações em que funcionários, relativamente jovens, faleceram tendo as empresas recebido o valor clausulado no seguro. Efectivamente, pode parecer chocante mas a realidade é que foram as empresas que pagaram os seguros e durante este período o empregado podia morrer ou não, o risco era sempre da empresa e, além disso, a morte destas pessoas foi perfeitamente natural e não causada pela empresa empregadora.
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Como este, existem vários outros casos que uma análise mais isenta e objectiva desmonta com facilidade, foi o que aconteceu no debate que se seguiu.
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O debate pós-filme foi interessante e educativo. O Professor César das Neves possui uma capacidade única de tornar claro e acessível qualquer conceito mais elaborado, aliando a isto uma boa disposição e simpatia contagiantes. Como seria de esperar, criticou de forma demolidora a obra de Moore, em particular a forma demagógica e exagerada com este que apresenta situações verdadeiras mas descontextualizadas, aproveitou também para nos alertar para as vantagens que vieram com o capitalismo; o acesso ao crédito, impossível até há poucos anos, e a melhoria das condições de vida das populações.
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Acima de tudo, a questão está numa análise equilibrada da realidade. È natural que o capitalismo tenha falhas e ineficiências mas o fundamental é que se trata do pior sistema com excepção de todos os outros, conforme referiu Nicolau Santos. O ponto crucial para todos está no facto de que Moore critica mas não apresenta alternativas verosímeis, Moore descredibiliza ao mesmo tempo que revela desconhecimento dos assuntos (“too complex”) no que toca a derivados, por exemplo.
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Um filme interessante, por vezes chocante mas infelizmente com pouca credibilidade e muita demagogia. Não vale o custo de um bilhete de cinema! Seria talvez interessante pedir a Moore para realizar um filme sobre Portugal utilizando a mesma ironia e recorrendo aos nossos muitos casos mediáticos. Seria hilariante!

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